A importância dos trabalhos manuais no currículo Waldorf leva em consideração os diferentes modos de existir produzidos a partir do contato com produto feito à mão. A imperfeição de trabalhos manuais é uma marca relevante no processo de aprendizagem. Quando o aluno dos primeiros anos do Ensino Fundamental faz um forrinho redondo de crochê... inevitavelmente haverá falhas e correções e revisões são feitas. Essas marcas fornecem lições em humildade - no sentido original da palavra - derivada do latim humus que significa 'terra'. A experiência de falibilidade do aluno é uma experiência que envolve seu relacionamento com o resto da natureza. É este relacionamento que Rudolf Steiner, idealizador da Pedagogia Waldorf e outros pensadores de sua época perceberam que a máquina poderia alterar. (Rena Upits, As artes perdidas, Revista Profissão Docente, Universidade de Uberaba, 2009).
Triste nome: artes perdidas. Mais triste ainda é ver as artes perderem-se onde elas mais deviam ser preservadas: sua origem, como é o caso aqui da Europa. São chamadas artes perdidas os trabalhos manuais e/ou domésticos em que as pessoas se envolvem com as mãos e que estão se perdendo neste mundo de tecnologia e terceirização de serviços. Atividades como costura, culinária, organização da casa, bordado, jardinagem, tricô, crochê, carpintaria, entre tantas outras, são cada vez menos presentes no dia a dia das pessoas e, por isso mesmo, consideradas artes perdidas. Na educação convencional, as artes feitas pelas mãos humanas são pouco ou quase nada valorizadas e assumem um lugar de menor importância no ensino escolar. As poucas manualidades que ainda não se perderam completamente entram para o currículo não como parte importante do plano de ensino, mas como recurso lúdico ou ilustrativo. Como é o caso da jardinagem e dos plantios para os estudos do meio, nas atividades de ecologia e educação ambiental. A educação Waldorf é citada como um dos poucos exemplos onde ainda se pode encontrar os trabalhos manuais como parte integrante de um programa educacional. Lugar que ocupam na medida exata de importância das demais disciplinas. Mesmo assim, nos últimos anos, até nas escolas Waldorf, as artes manuais vêm perdendo território e tempo em sala de aula. E um dos principais motivos dessa perda de valor é a pressão dos sistemas avaliativos institucionais que, ao enfatizar mais o conteúdo intelectual do que o conhecimento corporal e intuitivo, acabam, em última instância, homogeneizando os conteúdos disponibilizados e as vivências que são oferecidas pelas escolas aos seus alunos. A perda das artes desinveste o ser de sua capacidade de expressão. Cria modos de existir submissos ao consumo. O mundo passa a ter valor de compra, pois só pela compra o ser pode estabelecer contato com seus pares e sua cultura. A pergunta que cabe fazer é: a quem favorece esse tipo de estrutura social? Certamente, não aos alunos que perderem a arte.
Texto de Nina Veiga
Nina Veiga é artemanualista, ativista delicada, doutora em educação, escritora e conferencista. Sua pesquisa habita o território da casa, suas artes e terapêuticas, na perspectiva da antroposofia da imanência, junto ao cuidado de si e do outro.